[Entrevista] Fake News: quem são seus propagadores e como combatê-los?

Como combater as fake news? Confira em entrevista exclusiva:

O que são as Fake News, quem são seus disseminadores e como combatê-los? Essas são algumas perguntas importantes para refletirmos sobre nosso papel enquanto cidadãos.

Para esclarecer esses assuntos conversamos com o professor Rodrigo Ratier, jornalista com 17 anos de experiência em mídia impressa (passando por revistas como Superinteressante, Mundo Estranho e Galileu) e digital (websites e redes sociais), com ênfase em edição e administração de produtos editoriais. Há 8 anos ele integra a equipe da Nova Escola e atualmente é editor executivo da revista. Na área acadêmica ele se formou em Doutorado pela USP, com defesa de tese sobre o jornalismo de educação. Também foi coordenador da área de comunicação e educação da ONG Repórter Brasil, professor universitário e do Ensino Médio. Também foi um dos fundadores do Projeto Redigir, curso voluntário de redação e cidadania na ECA USP. Veja a entrevista a seguir:

O que são as Fake News?

Rodrigo: Se analisarmos simplesmente pela tradução, as Fake News são notícias falsas. Mas não é uma definição tão simples quanto parece e talvez o termo seja até um pouco impróprio porque existe uma gradação de Fake News. Por exemplo, aquela notícia que circulou na eleição do Trump: “Papa apóia Trump para presidência dos EUA”, é uma notícia totalmente falsa. Mas temos um gradiente de falsidades que vão desde os famosos “óclinhos” quando você edita um trecho do debate para dar impressão que um dos debatedores humilhou o outro, enviezando a informação, ou quando você usar de linguagem agressiva, como por exemplo: “fulano detona…”, “ciclano humilha…”, “fulano passa vergonha…”, também pode ser encarado como Fake News. Também existem os erros de informação, que, em alguns casos, também acabam sendo apropriados por grupos e favorecem o ambiente das fake news (propositais ou não). Por exemplo, quando o Jornalivre, que é um site que é teoricamente ligado ao MBL (Movimento Brasil Livre), diz que uma reporter da CBN errou ao mostrar a guarda metropolitana, jogando água na população de rua. Esse fato ainda não está esclarecido (se aconteceu ou não). Esses erros de informação também podem ser encarados como Fake News. É um “caldeirão” bem grande…

Por que elas se propagam tão rápido?

Rodrigo: Acho que a linguagem é um fator importante. A linguagem é simples e forte e tem esse viés “clickbait”, essas armadilhas, do tipo: “o que acontece nesse vídeo você não vai acreditar” ou “Veja a humilhação que o fulano passou”. Tem também o lado de explorarem o “incrível”: as fake news sempre tendem ao exagero, quando alguém pensa “não é possível que isso esteja acontecendo…” aí a pessoa clica. E tem o fator da confirmação. Por exemplo quando você recebe uma fake news sobre uma pessoa ou um político, que ela não gosta, em geral ela tende a repassar, concordar e dizer “tá vendo….?”

Você está imerso num ecossistema de notícias que tende a confirmar o que você gostaria que fosse verdade. Porque as pessoas têm um consumo que tende a ser mais emocional que racional. Então muitas pessoas tendem a compartilhar coisas que são emocionalmente verdade pra elas.

Na sua opinião as Fake News influenciaram as eleições de 2014 e podem influenciar as eleições no Brasil em 2018?

Rodrigo: Em 2014 eu acho tiveram alguma influência sim. Uma fake news que circulou no dia da eleição, por exemplo, foi aquela que o doleiro Alberto Youssef, testemunha-chave na Lava Jato estava à beira da morte e que o PT teria tentado matá-lo. Essa notícia foi rebatida no mesmo dia: ele tinha tido uma arritmia e estava bem, até tirou uma foto fazendo sinal de positivo. Seria difícil medir qual foi o grau de influência nos votos. A Dilma Rousseff acabou ganhando de qualquer jeito, mas talvez ela teria ganhado por uma margem maior… Não sei… Eu acho que não tenha sido tão importante assim… Para 2018 eu sou otimista porque eu acho que as Fake News têm uma vida curta. Eu acho que aos poucos as pessoas perceberão que algo está errado. Talvez elas não percebam o que exatamente, mas elas vão perceber que tem algo errado nesse mar de boatos.

Eu acho que elas têm mais familiaridade com algumas ferramentas, como o Whatsapp, que em 2014 era uma coisa muito nova… É a mesma coisa de quando você recebia um email sobre golpes e que todo mundo repassava. Hoje ninguém repassa mais… Talvez o Whatsapp (que é uma das ferramentas mais fortes de repasse das fake news) esteja chegando a esse período de maior maturidade. Não dá pra fazer nenhuma previsão específica, mas dá pra acreditar que as pessoas estarão mais maduras em relação às Fake News e talvez elas não sejam tão relevantes.

O que você acha do fenômeno Doria no marketing?

Rodrigo: O Dória, de fato é muito hábil em redes sociais. Um cara que está sempre presente. A capa da Vejinha essa semana é ele reconhecendo “só não estou na internet quando estou dormindo”. Mas o que rolou foram boatos normais de campanha, acusações do tipo: “Dória não paga IPTU de casa em Campos do Jordão”, o Haddad acusado de não ter feito nada pra diminuir as filas das creches… E por aí vai.

Sabemos que muitos produtores das fake news têm motivação política, mas e os disseminadores? Quem são as pessoas que compartilham esses conteúdos?

Rodrigo: Existem duas motivações para as Fake News: a primeira é política. Grupos políticos e de interesse que têm como objetivo, sobretudo, difamar os adversários…e tem uma outra motivação que é a econômica. Tem muitos produtores de Fake News que não têm um lado ideológico tão claro, mas que estão interessados em pegar carona nos assuntos do momento pra levar as pessoas pras páginas deles. Nessas páginas que você pode ver que existem inserts pra anúncio no Adwords, ou seja, eles ganham com o tráfego. A motivação econômica é forte, por exemplo, no caso das fake news produzidas no Leste Europeu. Descobiram (se eu não me engano na Bósnia) um site que de vários rapazes que produziam fake news sobre o Trump interessados no tráfego que essas notícias traziam para ganhar dinheiro com anúncios..

Algumas redes sociais como o Facebook anunciaram iniciativas de combate às notícias falsas. Na sua opinião, como podemos combater a disseminação delas enquanto cidadãos?

Rodrigo: Primeiro queria dizer que a iniciativa do Facebook é muito tímida até o momento. Participei de um encontro no Facebook, representando a Cásper Líbero, sobre Media Literacy (alfabetização pra mídia) que estuda como as pessoas consomem as notícias. Eles listaram 17 itens que visam coibir as fake news, mas que não foram vistos por ninguém da comunidade acadêmica. O Facebook está devendo muito ainda, eles também são responsáveis pela propagação de fake news. Eles podem alterar o algoritmo para que produtores contumazes de fake news não terem seu produto disseminado. A segunda coisa é para combater as fake news, enquanto cidadãos, o que a gente chama de boas práticas no consumo de noticias: não passar pra frente noticias que a gente não conhece a procedência, cruzar fontes de informação… Se você lê uma coisa que parece esquisita, cruze com outra fonte, veja se essa fonte de informação é de um veículo que você já conhece.

Os produtores de fake news geralmente usam campos semânticos apelativos como Jornalivre, Pragmatismo Político, Ceticismo Político, Pensa Brasil… E não é só a direita que usa… É da esquerda pra direita… Eles usam palavras com carga semântica de seriedade, “liberdade”, “independência”, pra tentar passar a ideia de que eles são respeitáveis. Vale a pena sempre clicar no expediente pra ver quem são os responsáveis por aquele veículo, porque geralmente os sites de Fake News não têm assinatura, não têm jornalista responsável… Fique atento ao uso da linguagem e termos ofensivos e a como você lê as notícias.

A educação nas escolas de base poderiam ajudar nesse sentido? Como podemos promover a cultura da checagem de informação?

Rodrigo: A educação de base poderia ajudar, mas ainda é muito focada nas disciplinas tradicionais: Matemática, português. E a reforma curricular que está acontecendo com a base nacional curricular também não está ajudando em nada a formar para a leitura de noticias. Nada, zero. Poderia ajudar, mas não está acontecendo.

Já a cultura de checagem da informação é um trabalho de longo prazo, as pessoas ainda precisam amadurecer. Pras pessoas é uma coisa muito nova: receber notícias que não são da Globo, Veja, da Folha… Um papela que antes era só das mega corporações. Hoje como está tudo pulverizado e são milhares de fontes de informação fica difícil. É muito novo e um aprendizado que mesmo que faça parte da educação de base vai levar tempo. Às vezes até nós que somos jornalistas temos dificuldade de identificar o que é Fake News e o que não é e passamos coisas pra frente, imagina o público em geral.

Qual a importância do jornalismo e das empresas de comunicação e mídia nesse contexto?

Rodrigo: Antes de mais nada, as mídias tradicionais estão sob ataque. Tem uma frase do Tim Rosenthal que fala que o objetivo das fake news não é fazer as pessoas acreditarem nas mentiras, mas colocar todas as mídias no descrédito. Desacreditar todas as notícias que são produzidas. A mídia está passando por um momento difícil por causa disso… Ela está passando por uma situação de descrédito total. Em parte isso é culpa da própria mídia que também apostou na polêmica fácil, no uso de linguagem muito agressiva, no uso de informações mal checadas ou mal apuradas… Acho que pra se diferenciar desse lamaçal todo é preciso fazer um bom jornalismo e, de novo, os sinais não são otimistas porque as equipes estão cada vez menores (nas redações), tem muito menos gente efetivamente na rua, as notícias são muito mais feitas com agências de notícia ou com “cozinha de internet”. É preciso gastar mais dinheiro e gastar mais com jornalistas.

Entrevista realizada em conjunto por:

Alice Wakai é jornalista formada em 2012 pela Unesp e editora do portal E-Commerce Brasil

Giovanna Almeida é estudante do 2º ano de Jornalismo na Cásper Líbero e estagiária no portal E-Commerce Brasil

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