Chegamos a Nevada, o primeiro das primárias democratas com uma população mais diversa do que os dois amplamente brancos estados de Iowa e New Hampshire. Além de um grande contingente de população latina, Nevada é também o estado dos casinos e hotéis de Las Vegas, o que indica a presença de uma grande população da classe trabalhadora. De hoje em diante, Nevada também ficará conhecida como o estado que deu a Bernie Sanders a esmagadora vitória decisiva em direção à nomeação do Partido Democrata à presidência da República.
Até então, a imprensa hegemônica defendia a tese de que um socialista “idoso, branco e carrancudo” jamais poderia vencer com as populações não brancas do país, especialmente a população negra e latina. Suas ideias são “radicais demais”, sua “retórica é muito divisiva e polarizante” e seu apoio é “muito pequeno e restrito a fanáticos, ainda que combativos”. Pois bem, a notícia que temos para eles é de que vencemos o estado mais diverso até então pela maior margem das primárias. Bernie tem mais de 45% dos votos e, para desespero do núcleo da elite democrata, venceu o voto das populações branca, latina, pessoas com e sem diploma universitário, pessoas entre 17 e 29 anos, entre 30 e 44 anos e entre 45 e 65 anos, e homens e mulheres. Em suma, a candidatura de Bernie está amparada na construção de uma grande coalizão multirracial da classe trabalhadora.
Outro ponto interessante é que a imprensa hegemônica também argumenta que, apesar de vencer o voto popular repetidamente, Bernie é minoria no partido porque a soma do apoio dos demais candidatos ditos moderados é maior do que o apoio à sua candidatura. Pois bem, em Nevada Bernie venceu 47% dos votos contra 45% dos votos combinados de Joe Biden, Pete Buttigieg e Elizabeth Warren.

Por fim, vale dizer que estamos testemunhando a história se desenrolar diante de nossos olhos. Nunca antes na história das primárias democratas o candidato que venceu o voto popular em Iowa e New Hampshire perdeu a disputa. Ainda, nunca antes um candidato havia vencido o voto popular nos três primeiros estados. Ainda mais importante, nunca antes um candidato havia vencido o voto popular nos três primeiros estados, conquistado uma maioria multirracial ampla e, tão importante quanto, feito tudo isso sem um centavo de dinheiro de empresas e da classe dominante, sendo financiado pelas pessoas comuns, em maioria de doações vindas de trabalhadores em uma média de contribuição de 20 dólares por pessoa.

Estamos diante de uma candidatura-movimento. Estamos diante do maior fenômeno contracultural da história recente da política estadunidense desde o movimento pelos direitos civis nos anos 1960. Estamos diante da maior coalizão multirracial e da classe trabalhadora no centro do capitalismo que se tem notícia na história recente desde o movimento capitaneado pela liderança socialista democrática de Martin Luther King.
O socialismo democrático marcha a largos passos para a vitória e, é importante deixar claro, politiza a classe trabalhadora em torno de sua condição como parte do sistema. Os resultados dessa campanha-movimento prometem durar muito mais do que um ciclo eleitoral ou mesmo um mandato. Mal podemos esperar.

Diego é um psicólogo e professor universitário sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e formado no interior. Entusiasta da revolução política socialista democrática em curso nos EUA.